Uma sala vazia. Um quarto vazio. Uma casa vazia. Você olha e já consegue visualizar tudo o que vai colocar ali. Um quadro, um balcão para dividir o ambiente. Uma plantinha para dar vida ao local ainda inerte. Tudo isso para dar a sua cara, o seu jeito, ao lugar ainda vazio. Você vai se construindo.
Fazer toda a mudança. Mudar dá trabalho, não dá? Carregar tudo que você tinha em outra casa, seja qual for: dos seus pais, da que você dividia com amigos, ou claro, de quem você tinha algum relacionamento. Carregamos muita coisa com a gente.
“Arruma um cantinho aí, pra esse coração teimoso
Libera umas gaveta e uns cabide
Que ele é espaçoso
E se ele der beijinho
Cê revida com outro”
E aí que vem uma reflexão: ao contrário do que pensamos, ninguém é uma casa vazia. Quando nós, consciente ou inconscientemente, nos instalamos no coração de alguém, devíamos ter a consciência de que, não, não estamos nos mudando para uma casa vazia. Em que poderemos escolher a cor da parede da sala. Colocar o sofá na parede da janela. Instalar o fogão de seis bocas.
Cada pessoa carrega sua própria mobília dentro de si. E achar que, ao se instalar no coração de alguém, nós temos o direito de organizar a casa do outro do nosso jeito, é algo completamente equivocado— e aqui não falo sobre relacionamentos mas sim sentimentos, coisas completamente diferentes mas que ironicamente podem se complementar. Ou não. Relacionamento é passar a dormir no sofá — ou na cama — da casa alheia. Sentimento é dar um quadro que a pessoa vai pendurar no quarto dela.
“Tudo que é seu, que tem aqui tudo que eu não quero guardar
que é pra esquecer de uma só vez
que este castelo só me prendeu, viu?
Mas o universo hoje se expandiu
E aqui de dentro a porta se abriu”
Até porque um dia, invariavelmente, você vai ter que sair dessa casa também. E aí, tem mais uma reflexão: você vai, mas sempre fica algo seu ali. Que ajuda a dar cara ao ambiente, que acaba fazendo parte da decoração definitiva da pessoa.
“Você fotografaria nossa casa sem mobília no natal
Que saudade de você
Ficaria pendurada no finalE depois de você
Qual de nós não viveria tudo outra vez?”
O vazio no peito que as vezes nos bate é enganoso. É mentiroso. Sempre tem algo ali. Um quadro deixado. Um livro esquecido. Uma conversa. Um beijo.
Ninguém é uma casa vazia.